Agilidade em Formulação Estratégica, é possível?

Muito se tem falado sobre a velocidade da mudança, cada vez maior, no mundo dos negócios. E como isso exige agilidade das empresas se querem sobreviver a estes tempos dinâmicos, particularmente na tomada de decisão e ação na criação de novos produtos, novos negócios ou no ajuste do negócio à nova realidade.

Por outro lado, quando se fala em estratégia é comum vir à mente a Visão de Futuro de longo prazo, sendo tomado como referência de tempo uns 5 anos à frente. Nesse contexto, ainda com essa referência de tempo adiante, muitos acabam por criticar, e até invalidar, os processos de formulação estratégica com o desenho de planos temporais que nos levem à visão.

O que está certo, e o que não está, na aparente contradição entre agilidade e plano de longo prazo?

Sem um plano, por menor que seja seu alcance temporal, corre-se o risco não se chegar a um bom lugar. A visão de futuro é sua bússola, o plano seu mapa, o instrumento que lhe mostra como avançar em direção ao destino almejado, mesmo que ao longo do caminho surjam obstáculos que exijam buscar desvios até que se consiga voltar ao rumo desejado.

Sem agilidade, sem que se tome uma decisão rápida para suplantar obstáculos que vão surgindo pelo caminho, perde-se a capacidade de avançar. Mas a agilidade não pode ser fruto de decisões intempestivas, de achismos, de sentimentos (bem, às vezes o feeling ajuda). A agilidade na tomada de decisão e consequente mudança de direção deve estar baseada em aprendizados, a partir de experiências anteriores, bem como observação do entorno e abertura a novas alternativas.


Agilidade Estratégica: da decisão sobre o Business Model à ação com o Business Plan

Sendo assim, a resposta à questão inicialmente colocada é sim! É possível conduzir uma formulação estratégica ágil, elaborar um business plan (plano de negócio) sintético, objetivo, que oriente as iniciativas estratégicas de um novo caminho a seguir. Trabalhando com algumas ferramentas relativamente recentes, embora fundadas em conceitos, teorias e práticas de há muito conhecidos, conseguimos traçar um modelo ágil para a formulação estratégica.

O modelo para formulação estratégica ágil, então, passa por duas etapas – desenho do business model (modelo de negócio) e consolidação do business plan (plano de negócio) –, avançando pelos seguintes passos a cada etapa:

              Business Model

  1. Esboçar a ideia (ferramenta: VPC – Canvas da Proposta de Valor)
  2. Explicitar as características diferenciadas dessa ideia (ferramenta: Matriz de Valor)
  3. Estruturar uma prova de conceito (ferramenta: MVP – Produto Mínimo Viável)
  4. Esboçar o modelo de entrega e captura de valor (ferramenta: BMC – Canvas do Modelo de Negócio)
  5. Validar a ideia com o MVP e o BMC (ferramenta: Pesquisa com Early Adopters)
  6. Estimar o tamanho do mercado no segmento-alvo (ferramenta: TAM-SAM-SOM)

              Business Plan

  1. Desenhar as ações para ida ao mercado amplo (ferramenta: Plano de Marketing)
  2. Projetar resultados esperados (ferramentas: Mapa Estratégico, DRE, P&L e Breakeven)
  3. Consolidar o business plan (ferramenta: Sumário Executivo do Plano de Negócio)
  4. (opcional, para buscar investidores) Elaborar uma apresentação sucinta do negócio (ferramenta: Pitch)

Esse modelo de formulação estratégica ágil é muito útil em casos de mudanças abruptas no cenário socioeconômico como ocorreram, por ex., nas crises do petróleo, das empresas pontocom, do subprime e da pandemia da Covid-19. Ele também pode ser aplicado para testar novas ideias, sobre novas linhas de produtos ou novos modelos de negócio, onde não há um histórico a ser analisado. É um modelo bem adequado num mundo de rápidas mudanças, metaforicamente falando, possibilitando navegar com algum controle em águas nunca exploradas, permitindo agilidade na tomada de decisão e ação.

Nos próximos artigos vamos explorar cada uma dessas etapas e suas ferramentas.

Fazer certo a coisa ou fazer a coisa certa?

Fazer certo a coisa certa

Em negócios, em empreendimentos, podemos dizer que ‘fazer certo a coisa’ está para a operação, assim como ‘fazer a coisa certa’ está para a estratégia. Então, a questão “Fazer certo a coisa ou fazer a coisa certa?” é fundamental, muitas vezes de difícil resposta, melhor seria dizer, decisão. Afinal, o que deve vir antes, a estratégia ou a operação? De fato, é preciso “fazer certo a coisa certa!

Sem uma estratégia competitiva se arrisca o futuro, sem uma operação consistente se arrisca o presente. Mas, cientes de que a estratégia se realiza na operação, e que implica mudanças nessa, podemos afirmar que a única resposta lógica, coerente, é trabalhar em ambas as frentes. Mas como? Separando os papéis, sejam com pessoas distintas ou agendas reservadas. Alguns devem pensar e planejar o futuro, enquanto outros devem cuidar do dia a dia. Cabe aos dirigentes de mais alto nível o papel de pensar e planejar o futuro, ou seja, definir as estratégias competitivas. Por sua vez, cabe aos gestores de nível médio a condução da rotina (operação), entregando os resultados planejados para o dia a dia e implementando as mudanças necessárias à manutenção e melhoria de resultados no futuro. Se eventualmente essas funções couberem à mesma pessoa, então essa deve dedicar agenda específica a cada um dos papéis.

Mas se isso está claro e certo, então onde está a dificuldade em responder à questão reflexiva que abre esta discussão? Em empresas bem estruturadas, com papéis bem definidos e distribuídos entre dirigentes e gestores, essa pretensa dificuldade não deveria existir. Mas esse não é o caso geral. Em muitas empresas esses papéis confundem-se, como em empresas com perfil familiar e muitas empresas pequenas e médias. Mesmo em empresas de grande porte, com funções bem definidas, não é incomum dirigentes voltados aos problemas do dia a dia. O quê fazer? Precisamos entender por que isso ocorre.

Primeiramente devemos compreender que é da natureza humana evitar riscos, neste caso, o equivalente a evitar atuar fora da área de competências. Assim é que muitos dirigentes, quando levados a esse posto mais elevado na estrutura organizacional, permanecem com sua atenção e ações no dia a dia. É ali que se sentem confortáveis, é onde desenvolveram competência e, portanto, sabem como agir. Pensar o futuro, analisar o ambiente de competição, traçar estratégias competitivas que diferenciem a empresa dos concorrentes, é algo novo. Há uma curva de aprendizado a ser respeitada, que começa com a percepção da necessidade de se apreender práticas e métodos de formulação estratégica, e passa por um esforço extra para adquirir novas competências e por uma atitude de assumir riscos.

Em segundo lugar, há a necessidade de obter resultados no dia a dia. Conselhos de administração (no caso de grandes empresas) ou os donos do negócio (em pequenas empresas, muitas vezes o próprio dirigente que também exerce a função de gestor), exigem retorno sobre seus investimentos, o que vem da operação. Assim, quando os resultados não acontecem como esperado, há a tendência de todos em “apagar incêndios”, todos viram “bombeiros”. Tudo bem se o incêndio é de grandes proporções, é preciso salvar o negócio (apagar o incêndio) antes de pensar no futuro. Contudo, com grande frequência o incêndio se instala pela falta de mudanças no dia a dia que levem a resultados melhores no futuro. Esse é o papel da estratégia, estabelecer mudanças importantes antes que elas se tornem urgentes ou até tardias.

Ambas as situações, aquisição de novas competências (apreender boas práticas sobre estratégia) e implantação de mudanças (assumir riscos e enfrentar resistências), exigem sair da zona de conforto. Antes de tudo, é preciso coragem e esforço para enfrentar esses desafios, às vezes humildade para pedir ajuda e, assim, ‘fazer a coisa certa’ sem deixar de ‘fazer certo as coisas’ no dia a dia.

(*) Artigo publicado originalmente no LinkedIn, atualizado